Comentavam os
aprendizes que a verdade constitui dever primordial, acima de todas as
obrigações comuns, quando Filipe afiançou que, a pretexto de cultuar-se a realidade,
ninguém deveria aniquilar a consolação. E talvez por reportar-se André à franqueza
com que o Mestre atendia aos mais variados problemas da vida, o Senhor tomou a
palavra e contou, atencioso:
— Devotado
chefe de família que lutava com bravura por amealhar recursos com que pudesse
sustentar o barco doméstico, depois de desfrutar vasto período de fartura,
viu-se pobre e abandonado pelos melhores amigos, de uma semana para outra, em
virtude de enorme desastre comercial. O infeliz não soube suportar o golpe que
o mundo lhe vibrava no espírito e morreu, após alguns dias, ralado por inomináveis
dissabores.
Entregue a si
mesma, ao pé de seis filhos jovens, a valorosa viúva enxugou o pranto e reuniu
os rebentos, ao redor de velha mesa que lhes restava, e verificou que os moços
amargurados pareciam absolutamente vencidos pela tristeza e pelo desânimo.
Cercada de
tantas lamentações e lágrimas, a senhora meditou, meditou... e, em seguida,
dirigiu-se ao interior, de onde voltou sobraçando pequena caixa de madeira, cuidadosamente
cerrada, e falou aos rapazes com segurança:
— “Meus filhos,
não nos achamos em tamanha miserabilidade. Neste cofre possuímos valioso
tesouro que a previdência paternal lhes deixou. É fortuna capaz de fazer a
nossa felicidade geral; entretanto, os maiores depósitos do mundo desaparecem
quando não se alimentam nas fontes do trabalho honesto e produtivo. Em verdade,
o nosso ausente, quando desceu ao repouso, nos empenhou em dívidas pesadas;
todavia, não será justo o esforço pelas resgatar com a preservação de nosso
precioso legado? Aproveitemos o tempo, melhorando a própria sorte e, se
concordam comigo, abriremos a caixa, mais tarde, a menos que as exigências do
pão se façam insuperáveis.”
Belo sorriso de
alegria e reconforto apareceu no semblante de todos.
Ninguém
discordou da sugestão materna.
No dia
seguinte, os seis jovens atacaram corajosamente o serviço da terra. Valendo-se
de grande gleba alugada, plantaram o trigo, com imenso desvelo, em valoroso trabalho
de colaboração e, com tanto devotamento se portaram que, findos seis anos, os
débitos da família se achavam liquidados, enorme propriedade rural fora
adquirida e o nome do pai coroado, de novo, pela honra justa e pela fortuna
próspera.
Quando já
haviam superado de muito os bens perdidos pelo pai, reuniram-se, certa noite,
com a genitora, a fim de conhecerem o legado intacto.
A velhinha
trouxe o cofre, com inexcedível carinho, sorriu satisfeita e abriu-o sem grande
esforço. Com assombro dos filhos, porém, dentro do estojo encontraram somente
velho pergaminho com as belas palavras de Salomão:
— “O filho
sábio alegra seu pai, mas o filho insensato é a tristeza de sua mãe. Os
tesouros da impiedade de nada aproveitam; contudo, a justiça livra-nos da morte
no mal. O Senhor não deixa com fome a alma do justo; entretanto, recusa a
fazenda dos ímpios. Aquele que trabalha com mão enganosa, empobrece; todavia, a
mão dos diligentes enriquece para sempre”.
Entreolharam-se
os rapazes com júbilo indizível e agradeceram a inolvidável lição que o carinho
materno lhes havia doado.
Silenciou o
Mestre, sob a expressão de contentamento e curiosidade dos discípulos e, finda
a ligeira pausa, terminou, sentencioso:
— Quem
classificaria de enganadora e mentirosa essa grande mulher? Seja o nosso falar
“sim, sim” e “não, não” nos lances graves da vida, mas nunca espezinhemos a bênção
do estímulo nas lutas edificantes de cada dia. O grelo tenro é a promessa do fruto.
A pretexto de acender a luz da verdade, que ninguém destrua a candeia da
esperança.
Do Livro Jesus no Lar - Néio Lúcio - Chico Xavier
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